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Somos o que Gostamos



"Eu Sou o Amor" é pura sedução!

Poucos filmes combinam uma análise formalmente perfeita das personagens e suas relações (de poder e conformidade) e o universo de emoções e sensações do seu protagonista. Tilda Swinton é incrível como nos convence da sua conformidade aristocrática num primeiro momento mas também como nos mostra em doses ideiais a tensão que os eventos desencadeiam:
algo de primário abala o universo e a rigidez do seu papel matriarcal.
Uma série associações espontâneas tornam difusa a linha entre a realidade e a projecção mental e fazem-nos mergulhar nos recantos mais obscuros da identidade mas apenas nos sugestionando, não elucidando.
É a contenção de costumes tão primorosamente mostrada no primeiro terço do filme que faz voar a libertação e exaltação dos sentidos que a chegada de um novo elemento (um cozinheiro) despoleta. Da comida, à religião, às cores e odores rurais, ao apelo cru e sem artifícios de um homem...somos levados magicamente à encruzilhada existencial e identitária da protagonista.

É um tema recorrente à DH Lawrence dos afectos primários e sua repressão cultural.
Somos o que gostamos. Somos os nossos afectos. Somos o amor. A incrível sequência final e a urgência que transmite é isso mesmo...é de puro instinto de sobrevivência. Verdades primárias que uma vez desenterradas já não são ignoráveis

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