
Dar às Pessoas o que Elas Querem
Dar às pessoas o que elas querem é um falso argumento. É o que se ouve em Portugal a torto e a direito para justificar a esterilidade da produção televisiva nacional. Ouvi, por exemplo, José Eduardo Moniz a descrever o TVI Jornal como um espaço de e para o povo, que veste os jeans, arregaça as mangas e vai à cata do autêntico e português que é o que as pessoas querem num telejornal (se não era isto era uma baboseira semelhante)...
A bitola e a exigência é um processo dinâmico e dialéctico. O oferta (está estudado) induz a procura. Não é a fatalidade de subdesenvolvimento cultural e estreiteza do mercado que dita a imbecilidade de quase tudo o que se produz na televisão portuguesa.
A Hbo vem prová-lo e é esse o seu legado. Demarcou-se, definiu a sua singularidade e é hoje uma enorme e global marca que, apesar de ter conteúdos muito desiguais no que à qualidade diz respeito, goza ainda, uma década pós-Sopranos, de uma conotação revolucionária. É esse perfil a que se agarra como se de um território próprio se tratasse.
Com o seu rasgo, inovou também na própria comercialização dos seus conteúdos e respectivas plataformas tecnológicas que os veiculam: produz televisão e cinema, bandas sonoras, performances cómicas e lançamento de DVD’s; distribuição de satelites, está na vanguarda de sistemas de codificação e serviços de televisão digital e on demand. (fonte: HBO’s on going legacy de Jefrey Jones e GR Edgerton -http://www.flowconference.org/rt19jonesedgerton.doc)
Resultado: é a mais rentável cadeia de televisão da história!
A revolução HBO foi a de quebrar expectativas e a standardização do formato televisivo assumindo a vanguarda da narração e estilos de realização até então sempre muito moralmente amarrados à vocação natural de massas da televisão. Neste sentido a televisão suplantou, nalguns casos (repito, a qualidade e inovação dos seus conteúdos parece-me bem desigual) largamente muito do cinema por aí se faz.
Libertou-se da sua preocupação de gerar consensos. Subverteu assim a própria de noção de público alvo, relativizando-a, problematizando-a.
Falando da tal desigualdade cito os meus 3 exemplos supremos de qualidade e rasgo que nos apresentaram na última década: Os Sopranos; Sete Palmos de Terra e…The Wire.
A marca de irreverência foi tão forte que se gerou uma febre actualmente já um pouco reciclada e canibalizada pelo apetite que tão forte e fidelizado nicho de mercado gerou. Muitas séries da própria HBO se arrogam hoje de um estatuto de pedrada no charco bem duvidoso e exagerado. Toda a gente quer surfar a onda do televisivamente incorrecto.
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