Avançar para o conteúdo principal

O ensino público de cinema em Portugal - relatório pessoal



Decidido a apostar definitavamente no cinema aos 30 anos, estou numa fase em que rentabilizar o tempo é essencial. Para além dos projectos em que estou envolvido ingressei na Escola Superior de Teatro e Cinema para dar mais um passo neste percurso.

Oitos meses volvidos posso dizer que o que encontrei não defrauda nem supera as minhas expectativas nem, de resto, contraria a minha experiência pessoal. A lógica tutorial e responsabilizante de Bolonha colide ainda com a cultura paternalista de que padece o nosso ensino universitário. Na ESTC temos como expoente desse espírito umas burocráticas folhas de presença controlam a assiduidade dos "meninos". Temos testes atrás de testes (teóricos): a antítese da criatividade. As próprias tutorias são muitas vezes meras imposições "despachadas" logo a seguir à aula sobretudo para suprir temas que não são "dados" no comprimido período lectivo normal. Numa inenarrável cadeira chamada "Estética" recuamos ao Kant sobre o qual temos que preencher fichas de leitura...etc, etc.

Aliamos isto ao habitual conforto e imunidade do pedagogo universitário que pouco se chateia com este cenário de pobreza temos um ensino de muito fraca qualidade.

Encontrei também um cenário de carência de meios brutal. A turma (de 40 alunos - penúria oblige)dividida em dois grupos observa, à vez e por breves segundos, aquilo que é uma câmara, um nagra, uma perche... O material utilizado é obsoleto. Por exemplo, durante a edição tivemos como software de edição um AVID com mais de 8 anos em que nem o privilégio um full screen temos. Também as câmaras usadas tinham mais de 11 anos.

Neste cenário há sempre exemplos de qualidade. Sobretudo 3 ou 4 professores altamente zelosos e inconformados com quem aprendi imenso! Nem tudo é mau. As componentes de história e de compreensão estética do cinema são fortes e muito úteis. Mas para aprofundar a técnica terei porfiar fora da ESTC.

Compete-me ir aproveitando como posso o que as minhas propinas possibilitam.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Convidado de Honra nº 5 - Jorge Vaz Nande e "As Portas"

Jorge Vaz Nande é colaborador das Produções Fictícias, onde, entre outras funções, gere os conteúdos do blog da empresa. É argumentista da empresa de conteúdos "Bode Expiatório". Fala-nos de várias questões relacionadas com o cinema e guionismo e, em particular, do seu último e original projecto "As Portas". Na tua colaboração com o Bode Expiatório: o trabalho que fazes tem sido feito sobretudo em equipa? Sim, num processo de colaboração e discussão que muitas vezes se estende da equipa criativa até às de produção e artística. Quando trabalhas em equipa, como se gerem diferentes sensibilidades? Quando várias ideias estão na mesa qual costuma ser o processo de decisão? É primordial que os participantes num brainstorm se dêem bem e tenham respeito mútuo pelas ideias de todos. A partir daí, a discussão das soluções criativas faz-se de comum acordo, tendo em conta a sua exequibilidade e eficácia. Existe alguma hierarquia criativa ou todas as vozes são iguais? Todas as i

"A Gaiola Dourada" e a Celebração do Cliché

Há, no filme “A Gaiola Dourada” um geunino carinho de Ruben Alves pelo estereotipo. Ele próprio faz da sua aparição no filme uma afirmação de caricaturalidade. É próprio de alguém bastante inteligente (e/ou esperto) que não quis de todo alienar públicos-alvo e, muito menos, produzir qualquer desconforto na sua comunidade de origem.  Mas também alguém que tentou consciente e integramente ordenar e pôr em jogo uma constelação de ideias e imaginários com que sempre conviveu. Lembrei-me de uma citação de Umberto Eco em torno de Casablanca (salvaguardando as devidas diferências de peso entre os filmes): " Casablanca não é apenas um filme. É muitos filmes, uma antologia [...] Dois clichés fazem-nos rir. Cem clichés tocam-nos. Porque sentimos que eles estão, de alguma forma, a falar entre eles e a celebrar uma reunião" . "A Gaiola Dourada" é uma sublimação da vida que dispensa profundas escavações sociológicas para fixar e ao mesmo tempo relativizar, de um

Alguns dos Filmes da Minha Vida nº 5 - Um Homem Singular

Neste soberbo filme um requintado formalismo, próprio de um fotógrafo/estilista, encontra-se com uma rara humanidade e profundidade da história e das personagens. Há "quadros" absolutamente maravilhosos, um festim sensorial, mas também momentos de pura intuição e sensibilidade. É essa sensibilidade que faz que o exercício estilístico não se sobreponha à pungente magia do seu drama. A subtileza que nos enleia com perfeição (na música e na fotografia, por exemplo) num dia de terminal angústia...a mesma subtileza que eleva Colin Firth a uma interpretação histórica, perfeita! Subtileza que Hollywood detesta: um ano depois premiaram-no pelos seus maneirismos, sempre ao gosto do tio Óscar, no anódino "Discurso do Rei"... É um filme extraordinário ao qual voltarei muitas vezes no futuro!