Do paradigma freudiano ao modelo bio-médico e à reflexão sociológica, algumas afinidades conceptuais emergem na teoria da violência: autoridade e conformidade e desvio, identidade…
Contudo, o filme “Uma História de Violência” não tenta uma abordagem genética da violência nem se arroga de qualquer polemização criminológica. Fosse essa a intenção e a análise de background e a flashbacks contextuais seriam recursos impreteríveis.
O primeiro terço do filme dá-nos mitologia harmónica da ruralidade, uma conformidade às normas frugal e semi-western. O retrato de harmonia reproduz-se no ambiente familiar com uma definição clara de papeis – potenciado pelo minimalismo positivo do registo musical.
O incidente central e respectivas consequências remetem-nos para uma análise do universo identitário da personagem. O tema recentra-se então numa busca pessoal – a preservação do sentido atribuído à auto-noção da personagem e a todo o inerente processo de construção das suas referências de conformidade (os clichés e estereótipos que povoam a primeira parte do filme têm desta realidade um papel ilustrativo: desde o papel convencional de chefe de família extremoso e marido apaixonado, ao emprego auto-criado e ao papel de cidadão exemplar exaltado pela comunidade). Neste diálogo identitário reside a riqueza do filme. O arsenal conceptual associado à teoria da violência está lá, sem que seja mobilizado para um mergulho do terreno movediço da causalidade do comportamento desviante.
Nessa causalidade e repescagem de passados e infâncias reside, em muitos filmes, o principal obstáculo à verosimilhança. Intuo que "Uma História de Violência" não seria o grande filme que é se tivesse sucumbido a tão comum tentação.
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