Ficam aqui uma breve descrição das considerações que gerou o Master Class de Abbas Kiarostami na apresentação do seu filme "Cópia Conforme"
O realizador iraniano admitiu que não consegue ajuizar sobre continuidades na sua obra. Quanto ao filme em si sofre da miopia própria de quem vê o fruto de um trabalho recente: "ainda não sinto o sabor do meu próprio cozinhado, que ainda está fresco, para já olho para ele com um olhar meramente técnico".
Admite "Viagem a Itália" de Rosselini com um dos filmes que mais o influenciou no princípio da sua cinefilia mas nem por isso vê uma ligação clara a "Cópia Conforme".
O seu espírito de constante experimentalismo teve numa produção internacional com actores estrangeiros um aditivo importante e que sublinha a universalidade das questões humanas levantadas. Não existem, segundo ele, traços de culturalidade no seu filme.
Num cenário de proscrição permanente na sua terra natal percebe-se esta tónica culturalmente relativista (este filme, como os restantes, foram banidos no Irão). O mercado negro, disse, tem sido o seu melhor amigo na divulgação da sua visão no país de origem. Geriu o trilinguismo do seu filme (não domina nem francês, nem italiano e apenas arranha o inglês) com um ultra cuidadoso casting e com uma noção instintiva das reacções e expressões dos actores que têm, no seu método, total liberdade para viverem as personagens.
O realizador produz geralmente os seus próprios filmes e permite-se certas indulgências e improviso no quotidiano de rodagem. Este filme era uma produção internacional e profissionalizada o que se traduz nalguma rigidez, no que se refere apenas à pequena diferença entre o guião original e o resultado final.
Kiarostami diz que é a sua vasta experiência que lhe permite abordar questões de complexidade de forma simples - ambição concretizável por poucos. Este extraordinário filme é um sublime exemplo desta capacidade. Não tem inspiração literária, ancora-se na experiência concreta do genial guionista que é Abbas. A este respeito diz que ao cinema é pedido que testemunhe e não apenas que crie. Esse testemunho é factor de comunhão entre todos nós. O que distingue o artista é a preservação e síntese dos detalhes na memória para utilização criativa.
Foi uma delícia o filme e o Master Class que se seguiu. O grande realizador deixou-nos ainda com uma visão de profundo optimismo quanto ao futuro, democratizado e liberto das restrições práticas, com a generalização do digital. Uma nova era que nos traz já um novo olhar cineasta por todo o mundo.
Fiquei sensibilizado com a ambição e irreverência enorme do seu olhar mas também pela sua singular humildade. O filme, esse, é uma obra prima absoluta.
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